27/07/2025 — 14:20
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Mortes de 96 bebês em Cabo Frio vai a julgamento internacional quase 30 anos após a tragédia

Clínica particular pediátrica é acusada de negligência médica. Corte Interamericana de Direitos Humanos decidirá, dia 26 de setembro, sobre caso ocorrido entre 1996 e 1997

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A Corte Interamericana de Direitos Humanos marcou para o dia 26 de setembro o julgamento do Estado brasileiro pelas mortes de 96 recém-nascidos entre 1996 e 1997 na Clínica Pediátrica da Região dos Lagos (Clipel), em Cabo Frio. A instituição particular, que recebia recursos do SUS na época, é acusada de negligência médica. O caso, considerado uma das maiores tragédias sanitárias da história do país, pode gerar condenações internacionais quase três décadas depois dos fatos.

Segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), ligada à Organização dos Estados Americanos (OEA), o Brasil falhou na apuração das mortes, não garantiu responsabilização dos envolvidos e sequer adotou medidas eficazes de fiscalização sanitária. As vítimas teriam morrido por infecções hospitalares evitáveis, como a causada pela bactéria Klebsiella pneumoniae, após internações desnecessárias.

O caso veio à tona em abril de 1997, após denúncias feitas por familiares ao Ministério Público do Rio de Janeiro. A reportagem do jornal O GLOBO revelou que, mesmo diante da elevada taxa de mortalidade — três vezes maior que a média nacional —, a clínica seguia funcionando normalmente. Até hoje, nenhum responsável foi punido.

Impunidade e sofrimento

Apesar de oito médicos terem sido indiciados por homicídio culposo, todos foram absolvidos em duas instâncias, em 2003 e 2005. A CIDH sustenta que a ausência de justiça e de medidas reparatórias provocou sofrimento prolongado às famílias. O órgão recomenda ao Estado brasileiro a indenização das vítimas, assistência psicológica e reabertura das investigações.

— Somos um grupo de pais e mães denunciando o Estado por acobertar o que o próprio Ministério Público chamou de “açougue humano”. Agora, o Brasil se defende com uma tropa de advogados em direitos humanos, tentando justificar o injustificável — disse uma das mães, sob anonimato.

Governo reconhece obrigação

O Ministério dos Direitos Humanos afirmou que, em caso de condenação, o Brasil terá de cumprir as determinações da Corte Interamericana, o que pode incluir mudanças nas políticas públicas de saúde e justiça. A pasta destacou que as decisões do tribunal têm “impacto direto na política interna brasileira”.

A Clipel, por sua vez, nega responsabilidade pelas mortes e argumenta que todos os médicos foram inocentados pela Justiça. Em nota, a clínica afirmou que a acusação é “esdrúxula e arbitrária”, e que a CIDH não ouviu os profissionais envolvidos.

Laudos e denúncias ignoradas

Laudos da época apontavam superlotação, más condições de higiene e falhas graves de conduta da equipe médica. Havia relatos de profissionais que não lavavam as mãos, não usavam máscaras e compartilhavam jalecos durante os atendimentos. Apesar disso, inspeções oficiais classificaram a clínica como adequada.

A então deputada estadual e sanitarista Lúcia Souto requisitou uma nova perícia feita pela Fiocruz, que concluiu que o número de mortes era “anormal” e diretamente relacionado à infecção generalizada. Mais de 50 exames identificaram a presença da Klebsiella pneumoniae.

Contexto de crise

O caso da Clipel não foi isolado. No fim dos anos 1990, diversas unidades neonatais do estado do Rio enfrentavam denúncias de superlotação e negligência. Em 1999, sete recém-nascidos morreram no Hospital Geral de Bonsucesso por infecção hospitalar, e outros cinco faleceram no Hospital Oswaldo Nazareth em menos de 72 horas.

*Com informações do EXTRA

Redação
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