A recente decisão da Prefeitura de Cabo Frio de terceirizar a alimentação escolar segue gerando indignação e protestos entre os profissionais da educação e a comunidade escolar. A ata de registro de preços 001/2024, realizada pela Secretaria de Educação na última semana e assinada pela prefeita Magdala Furtado (PV), transfere a responsabilidade da administração das cozinhas escolares para uma empresa do Espírito Santo, resultando em um aumento significativo no custo da merenda, que saltou de R$ 8 milhões para quase R$ 50 milhões – um crescimento de mais de 500%. No entanto, o impacto não é apenas financeiro. Para piorar, professores e funcionários em geral estão proibidos de se alimentar nas escolas.
A terceirização, além de gerar questionamentos sobre os valores envolvidos e a transparência do processo, afeta diretamente os servidores que, além de receberem salários defasados e não contarem com vale-alimentação, agora precisarão arcar com suas próprias refeições. “O professor já ganha mal, se ainda for gastar para almoçar todo dia fora, o dinheiro vai embora”, desabafa Rafael Carvalho, professor em duas escolas da rede municipal.
O educador aponta ainda, que a nova realidade exige, além de um custo adicional para as refeições, uma logística mais complexa para quem leva marmita, já que nem todas as escolas estão preparadas para fornecer estruturas como micro-ondas.
A mudança também levanta preocupações sobre a qualidade das refeições oferecidas aos alunos, uma vez que empresas terceirizadas podem reduzir a qualidade da alimentação. “Eu também fui, por muitos anos, professor do Estado e eu vivi essa terceirização da cozinha e eu sei o quanto a merenda do Estado é muito pior do que a merenda do município. Sim, extremamente pior. É uma questão nutricional bem precária mesmo, então acho que esse que é o principal problema relacionado à alimentação”, afirma Rafael, que teme que a situação se repita em Cabo Frio.
Além disso, as funcionárias das cozinhas, que há anos fazem parte da comunidade escolar, enfrentam a incerteza sobre seus empregos. Algumas poderão ser absorvidas pela empresa terceirizada, mas em condições de trabalho mais precárias, com jornadas mais longas. “Essas funcionárias têm vínculos afetivos com os alunos e professores. Nada garante que elas continuarão nas escolas, e a terceirização sempre explora os trabalhadores”, alerta o professor.
A decisão da prefeitura, segundo professores e membros do Conselho de Alimentação Escolar (CAE), foi tomada de forma unilateral, sem discussão com a comunidade. Uma conselheira do CAE classificou o processo como “obscuro e sem justificativa”.
O professor de história da rede municipal, Pedro Russo, também questiona o aumento repentino dos gastos com a merenda: “Os gastos saltaram de 8 para quase 50 milhões de reais sem qualquer justificativa plausível, além da piora na qualidade da alimentação e o risco para nossos colegas da cozinha”.
“Essa decisão unilateral da prefeitura, realizada de forma obscura e de um dia para o outro – sem o devido debate com a comunidade escolar-, visa a destruição da educação pública municipal de Cabo Frio. Além dos valores astronômicos, sem qualquer tipo de justificativa (pois os gastos com alimentação vão aumentar de 8 para quase 50 milhões de reais), a prefeitura mostra que não está preocupada com a qualidade de alimentação e de vida, das crianças, adolescentes, funcionários(as) e professores(as) que fazem parte da comunidade escolar cabo-friense”, completou.
O Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (Sepe Lagos) também manifestou indignação, convocando uma greve por tempo indeterminado. Denize Alvarenga, coordenadora geral do Sepe, destacou que a terceirização foi feita “às vésperas das eleições, sem audiência pública e com total falta de transparência”.
Na última semana, a Câmara de Vereadores convocou uma reunião para tratar da adesão ao contrato de terceirização, exigindo explicações do secretário de Educação, Rogério Jorge. Em resposta, o secretário prometeu disponibilizar os documentos que embasam a decisão e a justificativa dos custos. Paralelamente, um projeto de Decreto Legislativo foi apresentado para sustar os efeitos da adesão ao contrato.
A insatisfação culminou na convocação de uma greve e uma manifestação por parte do Sepe Lagos, que denuncia a destruição da educação pública no município. “Não vamos permitir que a educação pública de Cabo Frio seja destruída”, declara o sindicato. A paralisação teve início na quinta-feira (26), mas os profissionais retomaram as atividades no dia seguinte.
Em resposta, a Prefeitura Municipal afirmou que, em reunião com os diretores das escolas da Rede Municipal de Ensino, realizada na manhã da última segunda-feira (23), no Centro de Gestão Educacional Darcy Ribeiro, a coordenadora de nutrição, Fernanda Tofano Cabelino, esclareceu que a rotina atual de almoço para os funcionários será mantida, ao contrário do que foi divulgado por uma escola em suas redes sociais. Fernanda destacou que cada equipe diretiva conhece a realidade dos profissionais de sua unidade e que, durante o período de transição para a terceirização da merenda, essa prática será preservada. Após esse período, cada caso será avaliado individualmente pela equipe escolar.