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26/11/2024 — 00:25
  (Horário de Brasília)

Prefeitura de Cabo Frio ‘compra’ acervo de artista local e, quase dois anos depois, devolve obras sem pagar

Caó assinou o contrato de venda ainda na gestão do prefeito Bonifácio e, após tanto tempo, não foi pago. Diante dos prejuízos, ele optou por pedir anulamento; um protesto em apoio ao artista será realizado nesta quarta (24). Secretário de Cultura da cidade se pronunciou, veja

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Cultura em Cabo Frio tem preço. Pelo menos é o que diz a denúncia de Reinaldo Carlos de Oliveira, popularmente conhecido como “Caó”. Artista há 47 anos, ele vive da pintura e relata “falta de respeito” por parte da Prefeitura que, durante a gestão do falecido prefeito José Bonifácio, adquiriu um acervo de obras, avaliado em aproximadamente R$ 31,5 mil, sobre a cidade e, depois de quatro anos, decidiu devolvê-lo – sem pagar. Para ele, que tem suas artes espalhadas por vários países, a atitude do município também gerou “prejuízos incalculáveis”, pois além de dinheiro, o fato o abalou psicologicamente.

Diante disso, um protesto será realizado nesta quarta-feira (24), dia em que, depois de todo o ocorrido, recolherá as obras. O “ato de desagravo”, que está sendo amplamente divulgado nas redes sociais, vai reunir artistas, produtores e servidores em apoio ao artista.

O acervo composto há um ano e oito meses é reúne 14 obras que contam a história de Cabo Frio, segundo Caó, artista reconhecido por suas obras em toda a Região dos Lagos. O valor combinado – e nunca pago pela prefeitura -, foi de R$ 31.510,00. O documento é de 16 de novembro de 2022. À época, ao adquirir as obras, Bonifácio tinha como intuito expô-las no Palácio das Águias. O problema é que, em meio aos trâmites legais relacionados ao pagamento, houve a troca de governo.

Caó conta que a justificativa inicial dada para a falta de quitação do acervo era “uma dívida de IPTU em seu nome”, o que, conforme afirma, fez questão de resolver o mais rápido possível, até porque “tinha feito planos com a quantia acertada com a prefeitura”. Tendo em mente que estava tudo correto com relação ao pagamento, ele realizou planos – que não foram totalmente cumpridos – sobre uma viagem internacional para expor suas obras na Europa.

“E com tudo isso eu fiz planos, eu fiz projetos. Inclusive, estou vindo agora de uma jornada artística e cultural em cinco países: Portugal, onde eu fiz exposições, fiz workshop, palestra. Portugal, França, Espanha, Bélgica, Holanda… Estou há um mês e cheguei dessa minha viagem. Lá, infelizmente, [não recebi o apoio com o pagamento]. Além de perda, eu passei frustrações (…), como o meu filho, que não pude levar ele, porque esse dinheiro não saiu (…)”, conta Caó.

Muito abalado psicologicamente com a situação, ao chegar da Europa no início do ano, Caó conta que foi cobrar novamente respostas da prefeitura. Como resposta, afirma que o disseram, mais uma vez que “as obras precisavam passar por avaliadores” e que “resolveriam isso depois do Carnaval”. O artista destaca que o acervo já havia sido avaliado. Diante disso, ele conta que decidiu solicitar o anulamento do contrato de compra.

“Eles me pediram isso tem mais de um ano. Quando chegou agora, [pediram] de novo avaliadores, quando eu cheguei, né. Isso tem um mês, mais ou menos. Voltei lá de novo [e perguntei]: ‘Mas de novo? Vocês já pediram isso tem mais de um ano!’. Enfim, o meu alívio nisso tudo é que, apesar desse prejuízo todo é que eu vou retirar as minhas obras. É vergonhoso, mas as obras serão retiradas”, explica Caó, complementando:

“Estou muito chateado, dói na minha alma. Então aí deu esse ‘bafafá’ todo. (…) E quarta-feira (24) estarei retirando todas as 14 obras (…)”, concluiu.

Diante de toda a situação, um ato de apoio ao artista, que, além de ter reconhecimento internacional, comanda projetos sociais e já recebeu a Comenda do Mérito Cultural em 2008 da Associação Fluminense de Belas Artes – AFBA/Niterói, será realizado no momento da retirada total das obras.

Denominado como “ato de desagravo”, o protesto acontecerá em frente à Casa de Cultura José de Dome, o Charitas, às 11h desta quarta-feira.

Leia o texto que está sendo compartilhado junto à divulgação do protesto:

“A Cultura de Cabo Frio enfrentou um ataque sem precedentes! A obra e a trajetória de
um importante artista da nossa cidade foram frontalmente atacadas. Por que esse ataque em particular, entre tantos nos últimos anos, é o mais violento? O descaso e desrespeito impostos aos nossos principais patrimônios culturais deram origem ao Movimento Paralelo 24, que busca resgatar e valorizar a Cultura cabo-friense e seus patrimônios materiais e imateriais. As notícias diárias sobre a situação cultural da cidade nos deixam cada vez mais
indignados. No entanto, o ataque ao ex-diretor do Espaço Cultural Torres do Cabo e
proprietário do Atelier Casa de Caó foi o mais grave: Caó, hoje é um artista reconhecido em toda a região tendo recebido a Comenda do Mérito Cultural em 2008 da Associação
Fluminense de Belas Artes – AFBA/Niterói, e recentemente expos suas obras em turnê pela
Europa onde passou por 5 países naquele continente. Seu trabalho nos enche de orgulho, em 2022 o então prefeito da cidade de Cabo Frio, José Bonifácio através da Secretaria de Cultura adquiriu 14 obras do artista para o acervo municipal, que possui uma tradição
de grandes artistas plásticos. Infelizmente, mais de um ano e cinco meses após a compra, o município não apenas deixou de pagar ao artista, mas também arquivou o processo e
devolveu as pinturas, demostrando total desrespeito com o artista em questão.
Nós, artistas e ativistas culturais, a muito somos desrespeitados pelas gestões
municipais, CHEGA!!! O papel correto da Secretaria não seria devolver as obras, mas sim
buscar uma solução de pagamento que valorizasse o artista e sua obra.
Um absurdo! Uma vergonha. A cultura de Cabo Frio foi loteada e hoje é administrada
por pessoas que não conhecem nossa realidade, nossos valores e nossos verdadeiros
patrimônios. Estamos abandonados! Neste desagravo a Reinaldo Caó, dirigimo-nos aos servidores, agentes, produtores, ativistas e usuários da cultura, bem como à população em geral, para expressar nossa solidariedade ao artista, pois essa agressão à sua obra requer reparação ética, moral e institucional. Para concluir, convocamos todos a reagir enviando e-mails a jornais e mídia em geral denunciando esses acontecimentos”.

Diante dos fatos, o RC24H entrou em contato com a prefeitura da cidade, que respondeu que “a gestão anterior, de forma equivocada, incorporou as obras de Caó, ao acervo municipal, antes de concluir a compra do mesmo” e que explicou que tentou resolver a questão conforme determina a legislação, para que fosse efetuado o pagamento”, destacando que o “processo estava “aberto e em tramitação”.

Confira a nota na íntegra:

“A Prefeitura de Cabo Frio, por meio da Secretaria Municipal de Cultura, informa que a gestão anterior, de forma equivocada, incorporou as obras do artista plástico Reinaldo Caó, ao acervo municipal, antes de concluir a compra do mesmo.

Para resolver a questão, a atual gestão, com o conhecimento do artista, deu seguimento ao processo, colocando as obras dentro do plano de contratações anuais, conforme determina a Legislação, para que fosse efetuado o pagamento. O processo estava aberto, em tramitação.

Contudo, na semana passada, o artista retornou à Secretaria Municipal de Cultura, informando que tinha conseguido um comprador para o acervo dele, com valor acima do que o município pagaria. Diante do pedido de liberação das obras, a Secretaria de Cultura, vai devolver o acervo para o artista, que já assinou toda a documentação para a devolução e cancelamento do processo de compra que será paralisado e arquivado.

A atual gestão da Secretaria Municipal de Cultura reforça que tem se empenhado ao máximo para dar seguimento a diversos processos paralisados, como o do caso em questão e de outros que também não tiveram o andamento adequado, mas foram reabertos e terão a tramitação adequada, conforme determina a lei”.

Além disso, o secretário de Cultura da cidade complementou a nota destacando que “esse processo é uma sucessão de equívocos e problemas da burocracia administrativa”.

“A compra de uma obra de arte não é simples, precisa de avaliador para analisar a originalidade e o valor de mercado ou o artista ter notas fiscais de de obras “semelhantes”. Bonifácio foi a exposição, no Charitas, escolheu uns quadros para serem adquiridos para o acervo. O Caó faria uma viagem para Europa e Zé queria ajudar o artista comprando esses quadros. Aí foi o primeiro “equivoco”, porque o correto é avaliar a situação fiscal do artista e a análise jurídica da compra para só então pegar os quadros, mas… Abrimos o processo, ele não entregava as certidões dentro do prazo e teve problemas com a certidão da Receita Federal e com a municipal. Levou meses para acertar os débitos, só com o município a dívida era de 14 mil. Quando finalmente acertou o débito municipal, veio o parecer da CGM pedindo um analista dos valores (essa parte é possível resolver com outros documentos, aqui faltou articulação política por parte dos secretários da época) Quando veio o parecer da CGM ele foi pra Europa, depois virou o ano e tudo isso não entrou no PAC”, explicou o secretário.

“Isso é um resumo dos problemas que teve no processo, tá? A questão é que eu assumi em janeiro. E aí, esse ano, mudou a lei, que é o plano anual de contratações, né? De contratações anuais. E aí, tem uma série de exigências. Então, estava readequando e inserindo compras de obras de arte que não estavam nesse plano para estar no plano para, sim, a gente poder comprar. Só que essa semana, o artista Caó foi na secretaria, dizendo que teve uma proposta do empresário da cidade que queria comprar as obras por um valor até maior do que a secretaria ia pagar, do que a prefeitura ia pagar, tá? E assinou um documento pedindo a devolução das obras para que isso fosse feito. E pelo que eu estou percebendo, já estava tudo combinado com o grupo aí para fazer isso, para ter uma manifestação. Então, eu estou há três meses lá. Ele falou que está há um ano e oito meses lá. Como é que a nossa secretaria… Como é que a nossa secretaria não teve boa vontade, ou não teve respeito com ele? O processo demora a andar, não é assim? Então, vários outros processos estão andando, a gente tá andando com reforma, de um monte de coisa que tava parada, e o trabalho é sério. Então, a gente não tem distinção entre artistas, pelo contrário. A gente quer atender a todos de maneira democrática e igualitária, mas os processos e a burocracia demandam coisas, esse teve vários problemas ao longo, e a gente tava desatando os nós. Mas, ele fez esse pedido e a gente achou legítimo, né? Já que ele é o dono das obras, e teve esse programa durante um ano e oito meses, e apoiou ele”, complementou Márcio.

Por fim, ele mencionou um caso parecido com o de Caó.

“O próprio Ivan Cruz, que estava com o processo arrastando há anos, que era um problema semelhante, a gente conseguiu remediar e vai começar a reforma. Se o Caó esperasse mais um pouquinho, com certeza ia ser concluído a compra dos quadros. Mas ele está preferindo fazer um ataque político em vez de resolver o problema dele. E a isso eu não vou admitir, porque a gente está trabalhando sério, tecnicamente, atendendo todo mundo. Isso é inadmissível”, concluiu.

Ludmila Lopes

Graduada em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, pela Universidade Veiga de Almeida.

Já atuou como apresentadora na Jovem TV Notícias, em 2021. Escreve pelo Portal RC24h há três anos e atua, desde julho de 2022, como repórter do Jornal Razão, de Santa Catarina.

É autora publicada, com duas obras de romance e mais de 500 mil acessos nas plataformas digitais.

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