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24/11/2024 — 13:37
  (Horário de Brasília)

Nas águas da Lagoa de Araruama, moradores buscam o sal “que cura”

Visitantes buscam praias lagunares após relatarem melhoras circulatórias; efeitos da água salgada vêm sendo estudados pela talassoterapia há mais de 150 anos

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Os benefícios para a saúde proporcionados pela relação entre o ser humano e a natureza são investigados há séculos, especialmente no que se refere à água do mar e à alimentação. Práticas como a talassoterapia utilizam a água salgada em tratamentos terapêuticos, aproveitando as propriedades medicinais presentes nos sais marinhos. Um exemplo desse vínculo é a Lagoa de Araruama, a maior massa de água hipersalina permanente do mundo, com idade estimada entre 5 e 7 mil anos e alta concentração de cloreto de sódio. Com a melhora na balneabilidade, a laguna tem atraído moradores que acreditam no potencial terapêutico da água, buscando nela benefícios para o corpo e o bem-estar.

Localizada na Região dos Lagos, a Lagoa de Araruama está diretamente conectada ao mar pelo Canal do Itajuru e, em alguns pontos, pode chegar ao dobro de salinidade encontrada no oceano. Isso acontece porque a ligação entre o mar e a laguna é estreita, limitando a renovação da água e aumentando a concentração de sal.

Biólogo, consultor ambiental e secretário de Meio Ambiente de São Pedro da Aldeia, Mário Flávio

Segundo o biólogo, consultor ambiental e secretário de Meio Ambiente de São Pedro da Aldeia, Mário Flávio Moreira, enquanto a água do mar apresenta, em média, 34 a 35 partes por mil de sal, a lagoa pode chegar a registrar até 60 partes por mil em algumas regiões. Essa concentração representa quase o dobro da salinidade encontrada nos oceanos, caracterizando a lagoa como um ambiente hipersalino.

“Essa água hipersalina é comprovada, com diversos autores que já falaram sobre uma série de benefícios para a saúde humana, entendeu? Então, o maior nutriente que tem na lagoa hoje é o cloreto de sódio. Por isso que a lagoa tem essa economia toda no entorno das cidades, voltada para a salina, por causa da produção de sal”, explica o biólogo.

Um dos autores que destacaram os benefícios da água do mar foi o médico Joseph La Bonnardière, que, em 1867, introduziu o termo “talassoterapia”, unindo as palavras gregas thalassa (mar) e therapia (tratamento). Seu estudo defende que minerais presentes na água, como cloreto de sódio e magnésio — também encontrados na Lagoa de Araruama —, aliviam tensões musculares e ajudam a reduzir ansiedade e estresse. Ele também destaca que o sal fortalece o sistema imunológico e acelera a cicatrização de feridas. Ao longo dos anos, a talassoterapia foi amplamente adotada em regiões como o Mediterrâneo, onde tratamentos com água salinizada, algas e lama são usados para melhorar a saúde e o bem-estar.

Além de cloreto de sódio, principal mineral encontrado na laguna, e magnésio, Mario Flávio também explicou que a laguna conta com pequenas quantidades de cálcio, potássio, ferro, zinco e manganês.

Médica infectologista Apparecida Castorina

Segundo a médica infectologista Apparecida Castorina, “a atração pelo mar faz parte da história da humanidade”. A profissional destaca que já na Grécia antiga existiam procedimentos realizados à beira-mar. “Existem referências de que Hipócrates aconselhava o uso da água do mar e do clima litorâneo para fins terapêuticos”, destaca, mencionando, também, a talassoterapia.

Embora mais praticada em países europeus e pouco divulgada no Brasil, geralmente, não se tem informações sobre a prática da talassoterapia diretamente no mar. Estudiosos afirmam que esses benefícios são obtidos espontaneamente, através de, por exemplo, um mergulho. “A relação do ser humano com a água salinizada para mim é incontestável”, disse.

O mesmo princípio pode ser observado na Lagoa de Araruama, que se estende pelas cidades de Saquarema, Araruama, Iguaba Grande, São Pedro da Aldeia, Cabo Frio e Arraial do Cabo. Com mais de 80% de sua extensão passando por tratamento de esgoto ao longo dos anos, moradores e turistas passaram a utilizar a água hipersalina como forma de relaxamento.

Antes disso, na década de 1990, utilizar o local para fins recreativos era uma realidade distante, já que grande parte dos efluentes domésticos e industriais era despejada na laguna sem qualquer tratamento, comprometendo a qualidade da água, provocando a mortandade de peixes e causando odores desagradáveis. A recuperação apenas foi possível a partir de iniciativas de saneamento e despoluição, o que permitiu a gradual retomada das atividades recreativas e econômicas ao logo das últimas décadas.

“Isso aí é um processo, que as pessoas passam a frequentar em função da qualidade da água melhorando, e só melhorou por conta do tratamento de esgoto. Então, com certeza hoje tem muito mais balneabilidade do que no ápice da degradação da lagoa, que foi no início do ano de 2000”, explicou Mário Flávio.

Praia da Pitória, em São Pedro da Aldeia/ Foto: Luana Lopes

Quem concorda com isso é Tânia Cristina Medeiros Cardoso, professora aposentada, e sua família, que, desde 2023, passou a frequentar a Praia da Pitória, em São Pedro da Aldeia. Ela, que sofre com esporão do calcâneo, relata que costuma colocar sua cadeira de sol na beira da água para aliviar o inchaço e a dor nos pés. “O alívio é quase imediato quando saio da água. Ajuda a diminuir o inchaço e a dor”, compartilha.

Além disso, Tânia aproveita para observar a neta, Sabrina B., de quatro anos, que adora nadar na laguna. A menina, diagnosticada com Transtorno Opositivo-Desafiador (TOD), costuma ficar calma e demonstrar uma conexão especial com a água.

“É nítida a calma que ela sente depois dos mergulhos. O TOD costuma ser marcado por comportamento irritadiço, mas parece que, ao entrar na água, ela cria uma conexão especial que a ajuda a se equilibrar emocionalmente”, comenta a avó. “Ela fica mais serena. Gosta tanto que só sai da água na hora de ir embora”, acrescenta a aposentada.

Sabrina B. Lopes, 4 anos/ Foto: Sérgio T.

Questionada sobre o local, Tânia declarou que “a composição do ambiente, no geral, provoca uma sensação de bem-estar”. “Eu e minha família gostamos de passar as tardes na Praia da Pitória. A água é limpa, o lugar é tranquilo. Eu recomendo”, finaliza.

Marilete Boy de Oliveira, professora aposentada de geografia e moradora de São Pedro da Aldeia, também concorda com a teoria de que as águas da Lagoa de Araruama possuem “efeitos terapêuticos”. Segundo ela, “caminhar na água, água que é ‘remédio’, devido a sua alta salinidade, proporciona alívio nas dores das pernas e joelhos”.

Praia do Balneário, São Pedro da Aldeia / Foto: Marilete Boy de Oliveira

Para a aposentada, caminhar às margens da lagoa, enquanto contempla a natureza lagunar e observa os pequenos cardumes de peixes que saem rapidamente com a proximidade das pessoas provoca uma sensação emocionante. “Esse corpo hídrico faz bem para a alma e consequentemente para o físico”, disse Marilete, que costuma frequentar as Praias do Sudoeste e do Balneário por conta da temperatura da água. “Geralmente está morna, acredito que isso contribui muito para o relaxamento do nosso físico”, finalizou.

Ludmila Lopes

Graduada em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, pela Universidade Veiga de Almeida.

Já atuou como apresentadora na Jovem TV Notícias, em 2021. Escreve pelo Portal RC24h há três anos e atua, desde julho de 2022, como repórter do Jornal Razão, de Santa Catarina.

É autora publicada, com duas obras de romance e mais de 500 mil acessos nas plataformas digitais.

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