COLUNISTA RC24H / DR. CARLOS MAGNO: As eleições municipais e a pandemia do COVID-19

'Diante da excepcionalidade do momento, em que o fator tempo é uma variante a ser computada, não se pode ter certeza quanto ao futuro do pleito deste ano'


A pedidos, escrevo sobre o tema, buscando deixar de lado o linguajar jurídico do meu dia-a-dia para que ele fique prático e objetivo.

Uma pergunta que não quer calar. Haverá eleições neste ano?

Muitos acham que sim, pelo fato de que o pleito se realizaria em 4 de outubro e que o pico desta pandemia é esperado para perdurar, no máximo, até junho, o que levaria a crer que haveria tempo para realização das eleições.

No entanto, ao observarmos as consequências de uma pandemia, temos que seu maior efeito colateral é a incerteza, pois quase tudo se torna conjectura.

A verdade é que o mundo parou. De repente, e talvez pela primeira vez, os olhos da humanidade se voltam para si e esta, estupefata, percebe o quão insignificante é a própria existência.

De um dia para o outro, a força e o dinheiro não mais comandam o planeta. Na economia, a recessão afeta a todos. Nações ricas e pobres se desintegram e a força bélica também nada mais representa.

As armas atômicas são impotentes e imprestáveis frente a um inimigo até então desconhecido, frágil e que, por ser invisível, faz-se letalmente devastador. No momento, sem vacina, a única arma existente é a solidariedade, combinada com muita reflexão e resignação.

Assim, diante da excepcionalidade do momento, em que o fator tempo é uma variante a ser computada, não se pode ter certeza quanto ao futuro do pleito deste ano.

As eleições são em outubro. E para o grande público ela começa tão somente na segunda quinzena de agosto, com o início das propagandas eleitorais.

Mas, é aqui que reside o ponto nodal da questão.

Devemos ter em mente que diversos procedimentos precedem esse momento, sem os quais o pleito não é estruturado e concretizado, sem se falar nas brigas eleitorais que desde o início do ano costumam tomar os corredores do Judiciário. Cabo Frio conhece bem essa rotina.

Só que agora, com a Justiça praticamente paralisada, nada se resolve, reforçando o quadro de incerteza para o pleito.

Além do mais, vários outros procedimentos são atingidos pela circunstância em voga, cujo fator cronológico nos traz fortes dúvidas quanto à realização tempestiva das eleições de 2020.

Em abril ocorre o encerramento dos prazos de transferência partidária dos pré-candidatos (janela partidária) e, de igual modo, os prazos de filiação e de comprovação de domicílio eleitoral, atos que obviamente ensejam conversas e reuniões entre os vários atores do pleito.

No mês de maio, o que muitos desconhecem, a Justiça Eleitoral deve ultimar o recadastramento total de cada zona, o que requer o trabalho de vários servidores, além de ter no dia 6 o fim do prazo para que os eleitores solicitem seu alistamento, transferência ou revisão.

Já em junho, uma série de providências internas devem ser tomadas pela Justiça Eleitoral e também pelos partidos políticos no que tange à organização administrativa e financeira para participação no pleito, o que também requer grande movimentação de pessoas e agentes públicos.

Em julho, entre os muitos atos a serem realizados, reside o de maior importância e o que traz maior preocupação pelo contexto da pandemia: as convenções partidárias, que são realizadas entre 20/07 a 05/08 e pressupõem, justamente, a aglomeração de pessoas, sem contar o posterior registro de candidaturas.

Este ato formal exige grande movimentação dos Partidos, candidatos, servidores públicos e terceiros não só pelo seu complexo processamento face ao julgamento de milhares de impugnações como também pela necessidade de obtenção de documentos em órgãos públicos que nem sempre podem ser obtidos remotamente.

Tudo isto até a primeira quinzena de agosto.

É simples concluir, pois, que isolamento social não combina com disputa eleitoral. Não existe eleição sem povo na rua, até porque não existe política sem conversa de pé de ouvido, conchavos, traições, paixões e fofocas.

Tal fato é tão marcante que nem mesmo a era digital, e com ela as redes sociais, conseguiram desumanizar e suprir a necessidade de convívio interpessoal no que tange à realização da chamada “festa da democracia”.

Até porque, no Brasil, festa que se preze, requer pessoas, abraços, beijos, cumprimentos e, em se tratando de política, requer, especialmente no atual momento, união, responsabilidade, e acima de tudo, esperança.

Portanto, afirmamos que a realização ou não das eleições neste ano de 2020 ficará condicionada à evolução da atual pandemia, principalmente em que estágio estará a curva de contaminação no início do mês de junho.

Para não alongar ainda mais este texto, finalizamos com o compromisso de oportunamente aqui esclarecer tecnicamente as possíveis consequências da não realização das eleições municipais na regularmente aprazada.

 

 

 

*Dr. Carlos Magno é advogado especializado em Direito Eleitoral.

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