Traficantes agem como milicianos e invadem áreas de proteção ambiental em Arraial do Cabo

Parque Estadual da Costa do Sol tem, em uma semana, 700 mil metros quadrados de áreas incendiadas


Diante de um cenário de catástrofe ambiental, com desmatamentos e incêndios criminosos praticados por grileiros no Parque Estadual da Costa do Sol, na Região dos Lagos, a Secretaria estadual do Ambiente e Sustentabilidade (Seas) deflagrou uma ofensiva para frear uma avalanche de ocupações irregulares na área de proteção, que abrange seis municípios: Saquarema, Araruama, São Pedro da Aldeia, Arraial do Cabo, Cabo Frio e Armação dos Búzios. As operações começaram na quinta-feira (24) na Restinga de Massambaba (Área de Proteção Ambiental de Massambaba), distrito de Arraial do Cabo, especificamente nos bairros Figueira, Monte Alto, Parque Sabiá e Parque das Garças.

As áreas de proteção desses locais têm sido dizimadas desde o ano passado por grileiros e também por narco-milicianos, na definição do novo chefe do parque, Marcelo Morel. Ele disse que em uma semana a secretaria constatou, por satélite, 70 hectares (700 mil metros quadrados) destruídos por incêndios criminosos. Isso equivale a 1/3 do bairro do Leblon, que tem 215 hectares.

O primeiro alvo da série de operações fica numa faixa estreita entre o mar e a Lagoa de Araruama, em Arraial do Cabo.  

"Em todas as regiões há invasões, desmatamentos e incêndios criminosos. Tinha denunciado que 70 hectares já tinham sido queimados em apenas uma semana. Dei o alerta e aí as invasões ganharam força. Cercam lotes e constroem na beira da lagoa, em dunas, beira de estradas. Já descobrimos que há três quadrilhas de narco-milicianos. São traficantes que aproveitam o poder que tem nessas regiões para ter mais lucro com os loteamentos criminosos. Agora, isso acabou. Vamos demolir as construções e ajuizar ações para a demolição das que já estiverem prontas em áreas proibidas", afirmou Morel, acrescentando que as operações são feitas com homens armados até de fuzis devido à periculosidade de parte dos invasores. 

Segundo ele, há uma logística por trás das invasões. Ela inclui a queimada da vegetação utilizando pneus. "O desmatamento é feito com machado e facão. E na sequência eles botam pneus. É isso que dá a combustão. O negócio é violento.  Esse desmatamento incendiário é uma técnica. A gente pegou vários deles. Todos os bolos de incêndio com pneus", concluiu.

Morel disse que vai elaborar relatórios e encaminhar para o promotor Vinícius Lameira Bernardo, da 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Cabo Frio, que, na quinta-feira, ajuizou uma ação civil pública em defesa do meio ambiente junto à Comarca de Arraial do Cabo denunciando as invasões e pedindo a demolição dos imóveis construídos em áreas invadidas. O promotor disse haver notícias do envolvimento de agentes públicos de prefeituras da Região dos Lagos nessas ações criminosas e que isso está sendo investigado. Ele contou ainda que as estratégias das invasões incluem ocupações nos fins de semana e de madrugada para prejudicar a fiscalização. 

“Na ação, o Ministério Público pede que os invasores sejam intimados a desocupar suas residências no prazo de 20 dias, e após o termino do prazo, pede que o Inea (Instituto Estadual do Ambiente), a prefeitura de Arraial do Cabo e o Estado do Rio de Janeiro sejam autorizados a promoverem a desocupação forçada com a demolição das residências e posterior recuperação ambiental da área”, disse o promotor por meio de nota. - “Cuidam-se de três áreas que foram invadidas de forma clandestina e criminosa em setembro de 2018. Essas invasões têm ocorrido nos finais de semana e de madrugada, de forma a burlar a ação de fiscalização dos agentes ambientais.  Outra prática que vem sendo utilizada por esses invasores é a realização de queimadas criminosas nas áreas com vegetação, antes das invasões, de forma a facilitar a ocupação por seres humanos”. 

O promotor salientou a precariedade de recursos materiais e humanos do Parque Estadual da Costa do Sol, que tem 19 guarda-parques. E comentou a estratégia de invasão, que faz com que em apenas um dia uma casa de alvenaria seja construída. 

"São seis municípios que merecem a atenção dos guardas. Há dias em que apenas três agentes trabalham. O parque sofre com falta de estrutura. Existe um kit invasão. Constroem de forma rápida, em até menos de um dia, colocam cama, geladeira e aí, o órgão ambiental não pode destruir. Só com ordem judicial", contou o promotor. 

Por meio de nota, a Secretaria estadual do Ambiente informou que em apenas um fim de semana as equipes registraram 23 focos de incêndios criminosos na região. Segundo o órgão, a área devastada pelo fogo é equivalente a cinco maracanãs (36mil metros quadrados). 

A operação faz parte do projeto Olho no Verde, da Seas, que fiscaliza alertas de incêndio e desmatamentos por meio de imagens de satélite de alta resolução, o que, segundo o órgão, permite identificar, com precisão, desmatamentos a partir de 300 metros quadrados, ou seja, até mesmo o corte de uma única árvore. 

“Contando com a área do entorno do Parque da Costa do Sol, desde de julho de 2018, quase 110 mil metros quadrados foram desmatados por incêndios propositais”, diz outro trecho da nota da Seas. 

A Secretária do Ambiente e Sustentabilidade, Ana Lúcia Santoro, e o presidente do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), Cláudio Dutra, acompanharam a operação no local e determinaram uma série de medidas imediatas para combater as invasões.  

“Esta é uma ação de extrema importância para salvar o parque e impedir que crimes como esse continuem acontecendo. A partir de agora, cada tijolo que for colocado será retirado”, afirmou a Ana Lúcia. 

As operações está sendo feitas por agentes do parque, da Coordenadoria Integrada de Combate aos Crimes Ambientais (Cicca), de fiscais da prefeitura de Arraial do Cabo e de policiais militares do 25º BPM (Cabo Frio).

Criado em 2011, o Parque Estadual da Costa do Sol ainda não tem Plano de Manejo. Além disso, o número de guarda-parques, cuja profissão não foi regulamentada ainda, caiu de 30 até 2014 para 19 hoje. O número é insuficiente para fiscalizar toda a área; e não há equipamentos, principalmente para combate ao fogo, e nem carros para transporte dos guarda-parques.

 

*Fonte: O Globo.

Categorias: Arraial do Cabo Polícia

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